quinta-feira, 18 de setembro de 2008

A mulher de lábio leporino...


A mulher de lábio leporino, até agora acocorada a um canto e aparentemente distraída, após ter escutado o que diziam do outro homem, começou a portar-se de modo muito estranho. Ergueu-se e olhando Barrabás fixamente e com expressão de espanto no rosto pálido e famélico, gritou por ele com voz estranha e anasalada.

Nada havia de extraordinário; ela apenas o chamou pelo nome, mas todos a encararam admirados, sem compreender o que ela queria dizer. Os modos de Barrabás também eram estranhos, o seu olhar ia inquieto, de um lado para o outro, como quando ele queria evitar olhar directamente para alguém. O que significava tudo aquilo não se podia saber e, de mais a mais, pouco importava; o melhor era fazer de conta que não havia nada. Barrabás era bom companheiro, não havia como negá-lo, mas era assim mesmo, nunca se chegava a saber ao certo o que se passava dentro dele.

A mulher tornou-se a acocorar-se no seu canto, num pedaço de esteira estendido no chão de terra batida, mas sem tirar de Barrabás os seus olhos ardentes.

A mulher gorda trouxe comida para Barrabás, pois ocorreu-lhe que deveria estar esfomeado: certamente não se ganhava o que comer naquelas malditas e imundas cadeias. Pôs na mesa, na frente dele, pão, sal e um pedaço de carne seca de ovelha. Ele não comeu quase nada e passou os alimentos à mulher de lábio leporino, fingindo já estar satisfeito. Ela atirou-se à comida, devorando-a com a avidez de um animal. Depois precipitou-se para fora de casa e desapareceu.

Alguém se lembrou de perguntar quem era aquela mulher, mas naturalmente Barrabás nada respondeu. Este era o seu modo. Era sempre assim, não se conseguia arrancar dele qualquer coisa, quando se tratava das suas coisas pessoais.

1 comentário:

Anónimo disse...

Raios. Não se vai arrancar de Barrabás qualquer coisa? Deixe-o andar por aí a ver se a gente depois não o topa logo!
(mas este "depois" ainda vai dar muitas voltinhas - giras - está-me a parecer)
mairiam