- E porque é que se deixou crucificar, se tinha tanto poder?
- Sim, sim... Já sei.... Não são coisas fáceis de compreender. Sou um homem simples, sabes? não me é nada fácil compreender tudo isso, podes crer.
- Não estás certo de que ele vai ressuscitar?
- Estou, sim, claro que estou. O que eles dizem é verdade, estou convencido disso. O mestre voltará para se revelar em toda a sua glória e esplendor. Estou absolutamente certo disso e eles, que o afirmam, conhecem as escrituras melhor do que eu. Será um grande dia. Dizem que vai começar então uma nova era, a era da bem aventurança, em que o filho do homem regenerá o seu reino.
- O filho do homem?
- Sim. É como ele se chamava a si mesmo.
- O filho do homem?
- Era assim que ele dizia. Mas há quem acredite... não, não posso dizer...
Barrabás aproximou-se mais.
- Em que acreditam eles?
- Acreditam... que ele é filho do próprio Deus.
- O filho de Deus?
- É... mas pode não ser verdade. Quase nos causa inquietação. Eu gostaria mais de o ver voltar de novo, como ele era antes.
Barrabás não podia conter a sua agitação.
- Como podem eles dizer semelhante absurdo? - gritou exaltado. - O filho de Deus! O filho de Deus crucificado! Devias entender que tal coisa é impossível!
- Eu já disse que pode não ser verdade. Tornarei a dizê-lo, se assim o quiseres....
- Que loucos acreditam nisso? - continuou Barrabás. A cicatriz sobre o olho tornou-se mais vermelha, como sempre acontecia nas ocasiões em que se exaltava. - O filho de Deus desceria à Terra? E começaria por percorrer a sua região natal e pregar?
- Porque não? Seria bem possível. Podia começar lá como em qualquer outro lugar. É uma cidade pobre e pequena, bem sei. Mas em algum lugar era preciso começar.
O homem era tão ingénuo que Barrabás teve vontade de rir. Mas a sua agitação impedia-o. Durante todo o tempo compunha o seu manto de pelo de cabra, como se este estivesse sempre a cair-lhe dos ombros, o que não era o caso.
- E os prodígios que marcaram a sua morte? - disse o outro. - Já pensaste neles?
- Que prodígios?
- Tudo escureceu no momento da sua morte. Não o sabias?
Barrabás virou o rosto e passou as mãos nos olhos.