sábado, 22 de novembro de 2008

Ele sabia que o morto não ia sair da sepultura


Estava acocorado atrás de um arbusto de tamargas do outro lado da estrada, exactamente em frente à sepultura. Logo que o dia clareasse ele ia vê-la muito bem. Do lugar onde se encontrava ia vê-la perfeitamente. Assim o sol viesse!
Naturalmente sabia que o morto não ia sair da sepultura, mas mesmo assim queria certificar-se com os seus próprios olhos para afastar toda e qualquer sombra de dúvida. Levantara-se, por isso, muito cedo, antes do nascer do sol, e viera colocar-se à espreita, atrás do arbusto. Admirava-se do seu próprio gesto, ver-se ali, à espera de um milagre. Porque é que, afinal de contas, se interessava tanto pelo caso? O que tinha ele que ver com aquilo tudo?
Esperava que mais gente viesse ao lugar presenciar o grande milagre, e escondera-se, pois não queria ser visto. Mas era evidente que ali não havia ninguém a não ser ele mesmo. Coisa bem estranha...
Nisso, porém, avistou a certa distância, provávelmente no meio do caminho, um vulto ajoelhado. Quem seria e por onde teria vindo? Não tinha ouvido ninguém a aproximar-se. Parecia uma mulher. A vaga silhueta cinzenta mal se destacava na poeira da mesma cor.
O dia estava a clarear e não tardou que os primeiros raios de sol caíssem sobre a rocha na qual estava cavada a sepultura. Tudo se passou tão rápido que Barrabás nada pode ver, justamente nos momentos mais importantes. O sepulcro vazio! A laje tinha sido derrubada para um lado, e a cavidade aberta na parede da rocha estava igualmente vazia!
No primeiro momento, foi tal o seu espanto que ficou estatelado, olhando para a abertura na qual ele mesmo tinha visto depositarem o corpo do crucificado, e para a grande laje com que, sob as suas vistas, a tinham tornado a fechar. Mas depois compreendeu tudo. Nada de extraordinário tinha acontecido. A pedra estivera virada sempre; quando ele chegou ali já estava assim, e a sepultura estava também vazia. Não era difícil adivinhar quem havia derrubado a laje e carregado o cadáver. Os discípulos, naturalmente, durante a noite... Protegidos pela escuridão, tinham levado o querido e adorado mestre, a fim de poderem dizer mais tarde que ele ressuscitara, exactamente como predissera. Não eram precisos grandes cálculos para se chegar a essa conclusão.
Por isso é que eles não apareciam agora de manhã quando, ao alvorecer, o milagre devia ter acontecido!

4 comentários:

Anónimo disse...

Sabe-se lá! Mas é mais bonito e não custa nada acreditar que ressuscitou ao 3º dia conforme as escrituras.
:)
mairiam

Antonio Carvalho disse...

Nada se sabe, tudo se questiona...

Obrigado pelo acompanhamento :-)

Antonio

Anónimo disse...

Tá-se-me cá a parecer que esta história é para fazer render à espera que chegue a Quaresma e a Páscoa...
:)
mairiam

Antonio Carvalho disse...

Não. Isto porque na verdade não há caminho... faz-se caminho andando! Não tenho a história toda na minha mente, vou criando-a à medida que vou escrevendo. Sei que últimamente tem sido mais espaçada, mas são as contingências do tempo disponível :)
Antonio