quinta-feira, 2 de outubro de 2008


No dia seguinte, passeando pela cidade, Barrabás encontrou muita gente conhecida, amigos e inimigos. Pareciam na maioria admirados de o ver, e havia os que estremeciam como se tivessem deparado com um fantasma. Isso causava-lhe uma sensação desagradável. Não sabiam então que ele fora libertado? Quando é que compreenderiam que não foi ele o crucificado?

O sol estava ardente; como era estranho os olhos habituarem-se àquela forte claridade! Teria contraído algum mal na vista durante a sua longa reclusão? Em todo o caso achou melhor ficar na sombra. Ao passar pela galeria de colunas da rua que conduzia à praça do templo, resolveu sentar-se sob a arcada para descansar um pouco os olhos. Na sombra sentiu um grande alívio.

Viu, mais adiante, alguns homens sentados ao longo da parede. Conversavam em voz baixa e não pareceram apreciar muito a sua chegada, pois olhavam-o de soslaio e baixaram ainda mais a voz. Ouvia uma ou outra palavra, mas era-lhe impossível seguir o fio da conversa. Aliás, esta não o interessava, os segredos daquela gente não eram da sua conta. Um deles, homem da sua idade, tinha também barba vermelha igual à sua, que se fundia completamente nos cabelos ruivos, bastos e desgranhados. Os olhos azuis tinham qualquer coisa de singularmente ingénuo, e o rosto era largo e cheio. Tudo nele era grande e forte. Era um rapagão desempenado e, a julgar pelas suas mãos e vestes, devia ser artesão. Pouco importava a Barrabás quem fosse aquele homem ou qual o seu aspecto, mas era uma dessas pessoas que não se pode deixar de notar, embora nada houvesse nele verdadeiramente fora do comum, a não ser os olhos azuis.

O homem estava evidentemente triste e os outros pareciam partilhar da sua tristeza. Deviam estar a falar de alguém que tinha morrido, ou coisa parecida. De vez em quando todos suspiravam dolorosamente, embora fossem homens adultos. Se, de facto, assim era, lamentavam a morte de alguém, fariam melhor deixar os queixumes para as mulheres, a quaisquer carpideiras.

De repente, Barrabás percebeu que o morto do qual falavam tinha sido crucificado - e que tinha sido ainda ontem. Ontem....?

3 comentários:

Anónimo disse...

Ontem? Também fiquei a perguntar. Parece que já foi há tantos dias!

Não sei como é que um ruivo de olhos azuis foi parar à palestina há (2008 anos)-(33 anos)= número arredondado para anos.
mairiam

Antonio Carvalho disse...

Coisas da migração dos povos...

Anónimo disse...

Ou um mutante.
:)
mairiam