domingo, 12 de outubro de 2008

Vinha de longe, muito longe...

Ah, vinha de longe, de muito longe. Os seus olhos infantis tentaram expressar o quanto era distante o lugar de inde vinha. Confiou abertamente a Barrabás o quanto desejava estar na sua casa, na sua terra natal, preferida por ele a Jerusalém ou a qualquer outro lugar do mundo. Mas não podia jamais voltar, não podia morrer e viver na sua terra, como queria, como tinha imaginado outrora. Barrabás estranhou. Porquê? Quem o impediria, se cada um tem o direito de fazer de si o que quiser?
- Oh, não!... - respondeu pensativo. - Não é assim.
Barrabás não pode deixar de perguntar porque é que ele estava ali. O outro não respondeu logo. Depois, hesitante, disse que era por causa do Mestre.
- Do Mestre? O teu Mestre?
- Sim, não ouviste falar no Mestre?
- Não.
- Naquele que foi crucificado ontem no Golgotá?
- Ah, foi? Não sabia nada disso. Porque é que foi ele crucificado?
- Porque estava determinado que assim tinha que acontecer.
- Determinado? Estava decidido que ele seria crucificado?
- Sim. Está nas escrituras. Além disso, o próprio Mestre o profetizou.
- Ele predisse-o? E está nas escrituras? Não as conheço assim tão bem para estar a par do que elas dizem.
- Nem eu. Mas sei que é assim.
Barrabás não o duvidava. Mas porque motivo tinha o tal de fatalmente ser crucificado? De que serviria? Era bem estranho.
- É o que eu também acho. Não compreendo a razão dessa absoluta necessidade de morrer. E ainda por cima, de maneira tão horrível. Mas as coisas deviam passar-se como ele tinha profetizado. Tudo teve de acontecer como estava determinado. E ele mesmo - acrescentou o homem, inclinando a grande cabeça - repetiu tantas vezes que ia sofrer e morrer por nós...
Barrabás fixou-o no olhar.
- Morrer por nós?
- Sim. Em nosso lugar. Sofrer e morrer inocentemente, por nossa causa. Devemos admitir que somos nós os culpados e não ele.
Barrabás ficou a olhar para a rua e não perguntou mais nada durante um tempo.

3 comentários:

Anónimo disse...

Nunca entendi esta culpa bíblica, não lhe descubro a lógica que era necessário ter para eu a entender. Mas tudo bem. Entendo o que é fé (quando a há) e acreditar e já não é mau. Adiante.
mairiam

Antonio Carvalho disse...

Será que Barrabás entendeu? Mais, será que o outro entendeu? Será que nós alguma vez entenderemos? Será que entendemos o que é fé? Você entende? Eu entendo?
Você acredita? Eu acredito?

Antonio

Anónimo disse...

Eu acredito nas minhas coisas em que acredito (a par das coisas que tenho e em que não me fio). Talvez seja mais correcto chamar-lhe convicção que fé. Já que a palavra fé, tal como crença, tem uma conotação religiosa. Mas também podemos usar a palavra fé sem essa conotação. E se o fizermos tiramos-lhe um senhor peso dos ombros, a ela, à fé.
:)))
mairiam