sábado, 18 de outubro de 2008

Ressuscitar...





- Agora que ele morreu, compreende-se muito melhor aquilo que ele costumava dizer - murmurou o outro, como se falasse consigo mesmo.
- Tu conhecia-lo bem? - perguntou Barrabás.
- Claro. Conhecia-o muito bem. Estive com ele, lá em cima, desde o início, quando estava entre nós.
- Ah, bem. Ele era lá da tua terra.
- E depois segui-o sempre, por toda a parte, para onde quer que ele fosse.
- Porquê?
- Porquê? Bem, isso agora... Por aí se está a ver que não o conheceste...
- Que queres dizer com isso?
- Ele tinha... ele tinha um poder sobre as pessoas, compreendes? Um estranho poder, um domínio... Dizia simplesmente: "Segui-me!" e tinha-se de seguí-lo. Não se podia fazer outra coisa. Se o tivesses conhecido, compreenderias melhor... Também o terias seguido.
Barrabás calou-se. Mas após um momento de silêncio:
- Sim, deve ter sido um homem extraordinário, se aquilo que dizes é verdade. No entanto, o facto de ter sido crucificado não prova que a sua força, ou o seu poder, não era, afinal, tão grande assim?
- Não... não é isso. A princípio eu também pensei assim, e é justamente o que aflige - ter acreditado em semelhante coisa, ainda que fosse só por um momento. Mas agora creio que compreendi o sentido da sua morte ignominiosa, agora que reflecti um pouco e falei com os outros, mais versados nas escrituras. Vês, por nossa causa ele, inocentemente, teve de sofrer tudo o que sofreu, até mesmo ter que descer ao reino das sombras. Mas ele voltará para dar provas do seu infinito poder. Ele ressuscitirá de entre os mortos. Estamos absolutamente certos disso.
- Ressuscitar? Ressurgir depois de morto? Que coisa mais estúpida...
- Não é uma coisa estúpida, ele irá faze-lo. E muitos acreditam que será amanhã bem cedo. Amanhã será o terceiro dia. Ele declarou, parece, que ficaria três dias no reino dos mortos. Eu nunca o ouvi dizê-lo, mas consta que assim o predisse. E amanhã, ao nascer do sol...
Barrabás encolheu os ombros.
- Não acreditas? - perguntou o outro.
- Não.
- Não, não. Nem podes acreditar... Nunca o conheces-te. Mas muitos de nós acreditam. E porque não se ele ressuscitou tantos mortos?
- Ressuscitou mortos? Não é possivel!
- É sim. Eu vi com os meus próprios olhos.
- É verdade? Tu vis-te com os teus olhos?
- Claro que é. A pura verdade. O seu poder é ilimitado. Pode fazer tudo, é só ele querer. Ah, seria bom se quisesse usar esse poder em benefício próprio! Mas nunca o fez.

2 comentários:

Anónimo disse...

Este Barrabás, se tivesse andado na catequese ia lembrar-se de alguma coisa, agora que voltava a ouvir falar disto.
mairiam

Antonio Carvalho disse...

Barrabás foi um ateu, um bandido, um malfeitor. Mesmo que tivesse tido catequese, e parece que sim, pelo menos a julgar pela educação de então em que os barões eram "obrigados" a ouvir as escrituras lidas pelos anciãos, todo o seu comportamento até esta altura em que decorrem os episódios relatados, mostrava o oposto de todas as regras e leis aceites nesse tempo.
Vamos ver se no futuro acabará por se lembrar de alguma coisa....
Antonio